sexta-feira, 1 de junho de 2007

I) Diário dessa Poa Boa, atrasado apenas 6 meses

Depois de quase 6 meses resolvemos começar com o diário. A partir de agora, 01-06-07, prometemos ser mais atualizados. Nós quer dizer: Lenira Fleck com sua visão psicanalítica e Maria Tomaselli com sua visão de artista plástica.



Essa Poa é Boa, “meu querido diário”


Como começar um diário com seis meses de atraso? Tínhamos combinado de não fazer um catálogo, aquela publicação tão comum a todos os eventos de arte, que às vezes sai na abertura; nesse caso é incompleto porque deve ir para a gráfica ainda durante a montagem e por isso mostra outras coisas dos artistas do que as expostas ou sai depois, com todas as obras de fato expostas, mas o público já se foi embora e sempre falta a distribuição, esse problema tão mal resolvido pelas editoras. Por isso combinamos fazer um diário. Só que faltou acertar quem iria escrever o diário, escrever diariamente, anotar o curso e percurso desse gigantesco “work in progress” que é Essa Poa Boa.
Num dia frio, sentados no café do DC Shopping, Lenira Fleck e eu (TO) resolvemos então começar o diário; antes tarde do que nunca.
É um diário, diário, como aqueles que a gente guarda na gaveta, fechada, e só pode ser publicado 50 anos após a nossa morte? Ou é um diário publicável, que envolve gente com suas tão diferentes sensibilidades e suscetibilidades que podem ver tudo de outro jeito daquele do “diarista”?
Pois aí começa o problema. Dá para contar das brigas? Por exemplo, daquela minha com o Gustavo Nakle, ou devo dizer a briga do Gustavo Nakle comigo?
Cada lado é um lado e nossa briga foi realmente o início dessa POABOA. A primeira idéia era alugar um galpão, juntar dois ou três amigos e aproveitar a Bienal do Mercosul, essa que ajudamos a criar, para mostrar aos visitantes algo daqui da terra. Achamos essa fábrica da Renner no DC Shopping, aliás, achamos a Lenira Fleck e sua amiga Marise Mariano, Superintendente do Shopping, e as duas com certeza não sabiam em que iam se meter ao dizer sim, a fábrica está à disposição, com seus gloriosos 3000 m², e nós ficamos com um friozinho na barriga, sabendo que tantos metros não eram para três ou quatro, eram para muita gente! Eu, mulher, mais prática, queria logo montar uma comissão para administrar tal magnitude de empreendimento. O Gustavo, impulsivo e louco para começar já, achava que não era necessário, que eu ligasse para ele se precisasse, porque abrir e-mail, diariamente, não era com ele, nem ir em reuniões de comissões. Eu vislumbrava um futuro preto e finquei pé e ele deu no pé e assim acabou nosso primeiro encontro com o pessoal do Shopping. Lenira, que é psicanalista, não se abalou e disse para Marise: coisas de artistas, guarda bem esse momento para um dia contares aos teus netos.
Bom, fez-se a comissão, o Gustavo abre mails, aderiram ao projeto Blanca Brites e Paulo Gomes e muita gente mais, vendo nele algo quase inédito: um grande grupo de artistas trabalhando juntos.

Começou então o grade problema da escolha dos artistas. Sim, o galpão é pra muitos, mas não é para todos. Para quais? Para os amiginhos do peito? Paulo teve a idéia de dividir o espaço em lotes, deu 12 lotes, para doze artistas-organizadores do mesmo. Artistas-Curadores? Brrrrrr, esta palavra, hoje em dia, já não soa tão bem, sendo curadores indivíduos que tem uma idéia e usam os artistas como material para concretizá-la. Como chamar então? Surgiu o conceito Artista –Âncora. Sim, âncora de navegação, para o povo não se perder nas ondas da criação, para ter algo flutuante, mas não evanescente. Esse artista “ancorante” deveria ter algumas qualidades mais do que ser apenas artista, mesmo que fosse o melhor: ter paciência e talento de organização.
Chegou-se às 12 “vítimas”. Os 12 logo viraram 180 obreiros. Viu-se que era tarefa coletiva mesmo. Os que inicialmente acharam que cada um poderia fazer seu trabalho se renderam às necessidades de construir algo nesse espaço cedido que fosse bem mais do que a soma dos trabalhos dos convidados: uma obra coletiva mesmo, construída a partir das individualidades de cada um dos participantes. Tipo assim: cada um ajuda ao outro para realizar uma meta. Seja ela um barco, um jardim, uma cidade de cerâmica, uma escultura skatável, uma empena cega.
Claro que deu um frio na barriga e um nervosismo paralisante inicial: como começar?
O barco do Arroio Dilúvio começou primeiro, porque o Gustavo aportou na fábrica com um monte de ferros e seus “Arcanautas” foram todos convocados.
Dos “Navegantes” se ouviu falar que já percorreram o bairro a pé para mapeá-lo na forma da arte; dos outros grupos se viu algo nas palestras que deram ou na Livraria Cultura ou no StudioClio, ou não se viu ou ouviu nada ainda, a não ser títulos misteriosos como: “O Espírito dos Sais”, há mais “Navegantes navegando”, construtores de “Colunas”, o Grupo Entranças ” Trançando Poesias” (com índios de Pedra Lisa-Guarita, das terras indígenas Votouro e Rio da Várzea e Nonoai, de Serinha Irai, Inhacorá, Estrela, Lomba do Pinheiro, Morro do Osso, São Leopoldo) outros “Desenhando Intersecções”, ocupando a “Cidade”, lidando com “Ecologia”.
No caso do “MBoitatá” e do “Jardim móvel” (vizinhos de espaços) a solução foi chamar o Senhor Delmar (experimentado soldador, um senhor de uma certa idade já que já tinha feito umas esculturas e adorou essa loucura toda) e cair na água, para aprender a nadar: vamos soldar o quê? Vamos soldar o que quer que seja, depois a gente vê se fica ou desmancha; que a luz da solda nos ilumine! Com esse batizado forçado, as amarras se soltaram e hoje (29 de maio de 2007) já há grupos trabalhando nessa antiga fábrica da Renner e com isso começa o diário de verdade, contando o dia a dia desse trabalho de formigas.

Claro que a infra-estrutura está tomando um tamanho nunca imaginado, voluntários de todos os lados nos socorrem: o Selister tratando do site, aliás correndo com o site atrás, porque mal está atualizado, já ficou desatualizado, e todos estamos morrendo de inveja do site da BienalB que é tão ágil, meu Deus, como conseguem! Eta gurizada organizada e rápida no gatilho! Nós outros temos que aprender a nos organizar melhor, mandar notícias para o Selister.
O Régis e a Flávia ajudam na visualização do projeto, agora tentam ajeitar a logomarca, torná-la mais visível, sem descaracterizá-la, já que foi usada desse jeito. É que ninguém se preocupou muito com ela no início, também, quem poderia imaginar que o negócio todo ficasse tão grande. A Zeppelin está filmando e documentando passo a passo, os arquitetos vizinhos AT Design bolando como montar a parte”Homenagem aos Mestres”.

Ontem, milagre, instalaram uma recepção na fábrica, provisória ainda, mas com secretária trilíngüe, com uma velha mesa de escritório e a promessa de um lindo tapete. O que não faz um tapete! Ele concentra o espírito num espaço do tamanho de gente, o deixa acolhedor. Sem o tapete a recepção ficaria perdida nos 3000 metros quadrados, mas com ele ela vira uma tenda de beduínos, que tão sabiam se achar na imensidão do deserto, graças ao tapete. De certo ele vem do Expresso Oriente, do DC, apostando nessa POA.

Outros empresários estão ajudando, a Ouro& Prata com transportes, a Ferramentas Gerais com material, a Renner com tecidos, parece uma grande gincana e torcida. E precisamos também de algum dinheiro vivo, para isso chamamos o Marcos Lindenmayer que vai tentar vender pequenas quotas aos empresários da região Navegantes e Humaitá, que podem mostrar que estão apostando na revitalização dessa parte da cidade. A revitalização de uma parte de Porto Alegre é a grande meta do projeto: deixar algo para a comunidade, algo elaborado com a comunidade, a partir da exposição na fábrica. A exposição vai ser o ponto de encontro com os moradores, os colégios. Por esta eles vão saber quem somos, ela é nosso cartão de visita. Mas é com a comunidade que vamos elaborar o que deixar para ela de obra fixa. Para não impor nada, para não dizer: tomem. Não, eles vão discutir conosco o que querem. Utopia?
Pode ser, mas tem que se tentar deixar o autismo das artes plásticas e encontrar de novo um ponto de comunicação. Esse problema acomete a todos, só é muito difícil achar uma solução. A última Bienal de São Paulo não viu esse problema também e por isso se chamou: Como viver juntos? Dizem que ela se equivocou. Nós também corremos esse perigo, mas precisamos tentar.

Temos também outra grande atuação prevista, o atendimento às escolas. Vontade não falta para atender todas as escolas de Porto Alegre, deixar as crianças participarem de oficinas, de botarem a mão na massa; o que falta são voluntários, já que dinheiro não há. Esqueci de falar um pouco mais sobre esse picante detalhe: todos os envolvidos trabalham por paixão; desde os artistas, passando pelos educadores, administradores, organizadores do evento. Temos apoios de material e infra-estrutura, mas não apareceu, até agora, um “pilinha” que fosse. Não podendo pagar gente que dê atenção às crianças, temos que nós restringir às escolas do bairro que serão beneficiados com uma obra permanente. Como andam as coisas no momento, vamos fazer 12 intervenções urbanas, 6 nas escolas e 6 em espaços públicos. Articular tudo isso não é fácil. Contatos com Associações de Moradores e Líderes Comunitários estão em andamento. Apareceu uma mulher-maravilha, a senhora Palmira, esta é nossa interlocutora com a comunidade. Ela tem a mesma garra da famosa, já falecida, Dona Palmira das carroças (a protetora dos animais), assim é fácil lembrar o nome dela.

Parece-me que consegui resumir mais ou menos o que houve até agora num imenso primeiro dia de um diário atrasado, mas agora vai....

30-05-07 tarde
"QUERIDO DIÁRIO"! Eu não sei quem é mais louco se a Maria ou eu, mas sei muito bem quem é mais aflito: eu.
E o motivo da minha aflição é: COMO VAI FICAR TODO O CONJUNTO DAS OBRAS NA HORA DA ABERTURA?
será que não vai ficar um amontoado de tralhas ? Para que isso não aconteça "querido diário", vamos ter que nos reunir e cada um com seu vecino achar a melhor solução "querido diário" será que vai dar briga? Acho que não”. Assim mailou Gustavo Nakle
30-05-07 noite :
Flechas e Jardineiros:
Hoje batemos (o Gustavo e eu) um papo sobre a expo em si, não se tratando de áreas isoladas apenas: A expo em si também precisa ser uma obra de arte. Isso se chama qualidade da montagem. Uma coisa não deve matar a outra.
Achamos que a proximidade imediata da cobra gigante e do barco gigante pode criar um muro: the wall, um fire-wall, onde nada passa, nenhuma onda poética, lírica.
Sugerimos então de fazermos uma reunião para discutir se não seria melhor trocar a cobra pelo jardim, aí sim poderia se criar uma onda navegável. Já que estamos nos Navegantes e navegar é preciso. A onda sobe, a onda desce. O mesmo devemos ter em mente com os outros participantes também. Uma reunião urge.

31-05-07 blogs em pleno andamento: o André Venzon e seu grupo Navegantes percorre o bairro a procura do seu significado histórico, poético: http://navegantes2007.blogspot.com/. Para a gente poder se amar é preciso conhecer-se primeiro.

e o Achutti com seus sais do laboratório fotográfico informa: Tomaselli eu já tinha mandado o link, estou em Bento G e agora não lembro o endereço, mas se colocares no Google Goma Bicromatada estaremos em quarto ou quinto lugar - já estivemos em primeiro - e lá no nosso blog da goma que se chama Déjà-vu encontrarás um link para o outro do Sal - Espírito dos Sais. Com o Grêmio deu tudo certo, agora posso dormir, abraço !!
Bom, fui lá fuçar esta confraria alquimista dos sais misteriosos: http://projetosal.blogspot.com/

Querido diário...criamos um verdadeiro exercício cotidiano de como viver junto...agora apenas nos resta ..."simulações romanescas de alguns espaços" na antiga fábrica! Lenira

... e que a santinha milagrosa da Rue du Bac continue abençoando todos aqueles que queiram investir uns pilas no movimento...


31-05-07
Making of
Essa Poa é Boa vista por uma psicanalista...


Como rememorar 182 dias de um movimento que nasceu do desejo de dois artistas: Gustavo Nakle e Maria Tomaselli que buscavam alugar um galpão para organizar algo que pudesse dar conta da expressão artística local, um momento de confraternização dos artistas locais com os artistas convidados para a Bienal do Mercosul 2007? Desejo este que simbolizava provavelmente o desejo de tantos outros, tanto que, ao mesmo tempo em que foi criado o projeto Essa POA é Boa surgiu, paralelamente, o movimento Bienal B.
A primeira reunião...a fatídica!

Meu papel neste projeto, desde o início tem sido o de facilitadora. Uma escuta sensível e alguns relacionamentos agilizaram o processo de concretização do sonho, quando marquei uma primeira reunião...lá estávamos, sentados no café os quatro: eu, Marise Mariano - Superintendente do DC Shopping, Nakle e Maria Tomaselli. O objetivo era estudar algumas tratativas preliminares à apresentação de uma proposta para a administração responsável pela antiga fábrica Renner. Gente...não preciso dizer que foi o maior mico!

O papo inicial parecia muito tranqüilo, girava em torno do conceito da proposta, a que vinha cada um com seus anseios e expectativas. Naquele momento procurávamos unir os interesses do projeto a ser proposto com o planejamento dos empresários locais relacionados à responsabilidade social. Destilando o calor terrível que fazia discutíamos sobre o superaquecimento, como salvar o planeta, como excluir as sacolas plásticas do shopping, sobre as dificuldades da zona norte, etc. Até aí tudo muito civilizado. OK.
Querem conhecer a antiga fábrica? - pergunta Marise, já sensibilizada com a proposta – vou chamar o segurança para abri-la.


Os dois, quando viram o espaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaço, a mega fábrica, os olhos brilhavam. Tomaselli fotografava sem parar, freneticamente, e o Nakle coçava o queixo. Ele que se diz baixinho, mas com mania de grandeza, quase enlouqueceu quando se viu tão pequenino diante de tamanho espaço. Nossa! Impressionados com a descoberta.


E agora? Como convocar os artistas. Ainda bem que existe e-mail, ah, mas eu prefiro o telefone, capaz, e-mail, não, telefone é mais pessoal, não e-mail é mais prático, não, me recuso, mail, fone, ............................................................................


E assim, do nada, frente ao grandioso evento que se vislumbrava, iniciou-se uma discussão que era uma mistura da algo insólito com o temor da realização de um sonho.
Os dois protagonistas brigaram, sem cerimônias, na frente da Superintendente e foram embora um xingando o outro. Quem começou a briga até hoje não se sabe... O que parecia banalidade tomou o vulto de uma batalha que nem o analista de Bagé seria capaz de dar conta.
O resto vocês já sabem. É público. Eles se amam! Eis o POABOA um ato de amor à cidade de Porto Alegre.

By: Lenira

01-06-07

R-ECOnstruindo a vida é o título do projeto de Zoravia Bettiol
e grupo formado por artistas plásticos e arte-educadores, que participarão do movimento Essa POA é Boa realizando uma série de ações e eventos tendo como fio condutor a ecologia, incluindo oficinas de arte-educação com oficineiros da Associação Cristal Florido, que desenvolverão um trabalho, com diversas modalidades artísticas como desenho, pintura, têxtil, animação com massa de modelar com as crianças e jovens das escolas do bairro. Outra atividade prevista é a organização de palestras com representantes da Fundação Gaia e do Núcleo Amigos da Terra com o objetivo de sensibilizar e desenvolver uma conscientização sobre problemas que assolam o mundo.

By: Lenira

-Notícias da Ana Norogrando: O nosso grupo, parte dele, andava meio sumido porque (com estas chuvas) nós estávamos literalmente enterrados nas reservas indígenas, acompanhando e fotografando o trabalho de nossos companheiros Kaingangs . São 12 reservas, espalhadas a maioria pela região norte do estado, todas desenvolvendo peneiras.
Terça-feira chegamos carregados: com 36 peneiras prontas, muito interessantes para nossa sorte. O trabalho com eles está revelando surpresas muuuuuito positivas e gratificantes.
Na semana passada eu enviei algumas fotos (veja a seguir em Poética dos Símbolos Trançados) que fizemos nas reservas porque, no momento, o nosso campo de trabalho é lá.
De qualquer modo, tentaremos nos organizar para fotografar no dia agendado pela Zeppelin e Lenira. Acho a idéia da reunião ótima. Seria uma oportunidade para nos encontrarmos e trocarmos algumas idéias.
um grande abraço a todos
Ana

Um comentário:

Anônimo disse...

Uau
agora sabemos tudo.
Que trabalhíssimo o de vcs.
bjs
Marcia